A convidada
Paris!
As luzes brilhavam, e eu extasiada admirava o que via. Entre emocionada e deslumbrada, um frio percorrendo a espinha, lágrimas silenciosas desciam pela face... Um filme pela memória, uma volta no tempo, há quanto, eu esperava por esse momento? Enfim chegou... Ali não havia sorriso mais feliz que o meu.
A saída do aeroporto Charles de Gaulle foi permeada por pensamentos, enquanto o trem percorria o caminho e me levava rumo ao coração de Paris (e o meu em festa), e ao hostal, uma certa tensão no ar. Quando saí do metrô, “tipos esquisitos” beiravam os arredores da estação, mas a experiência alertava-me para o cuidado, e fiquei atenta, enquanto não me senti segura, não relaxei. Em Paris estava muito frio, e isso me faz tomar mais cuidado, afinal os passos são mais rápidos, o olhar mais cabisbaixo e a coluna fica mais vergada...
...Eu estava em Paris. Repetia silenciosamente: estou em Paris! A cidade do meu imaginário, o lugar dos meus sonhos de pré-adolescência. Sem jamais ter ido lá antes, via com clareza algumas paisagens e monumentos. Paris, tão cantada e decantada por poetas e cantores. Quantas vezes foi ficcionalizada, filmada e serviu de palco de revoltas furiosas, revoluções, passeatas, reivindicações e amores avassaladores...? Fez e é História; desde quando Paris, a cidade das luzes, me habitava? E me alimentava esse sonho de um dia estar nela, tanto quanto ela estava em mim?
Mas a hora era inapropriada para algo além dos pensamentos, o Montmartre me pareceu familiar, e o tempo permitiu-nos apenas deixar a bagagem e procurar algum lugar onde pudéssemos comer algo e tomar um café...
Paris vestira-se de dourado para nos receber, as folhas das árvores eram de um amarelo ouro, a confundirem-se com a íris dos meus olhos, que de cor-de-cajá, passara a outonal.
Ah, como lamento a minha limitação, como eu queria dizer belezas sobre a mais bela cidade do mundo? Não sou capaz, mas o que aqui deixo são as emoções que essa cidade me causou na alma...
A chegada ao Palais du Louvre não foi tão logo, afinal, queria passar no Centro Pompidou, mas à medida que eu me aproximava da Quadra do Louvre, criava alma nova e asas nos pés, o coração era só felicidade: Musée du Louvre! Entre o rio Sena e a Rue de Rivoli, o seu pátio central, ocupado agora pela pirâmide de vidro, diante dela, não me contive e outra vez (sou chorona que é uma beleza), as lágrimas me acudiam para não me engasgar com o nó na garganta... Saí disparada olhando tudo, captando tudo, cada detalhe do prédio do museu... E, e meus olhos adquiriam brilho novo, a boca rasgada de contentamento. Já havia planejado o que queria ver, afinal, em menos de uma semana não dá pra ver nem a metade do Louvre. Óquei, ingressos comprados, mapa na mão, hora de realizar mais um sonho... Tá ali, ali! O caminho para a Monalisa, entre ela e eu, a escadaria Darú, eu não andava, mas voava para avistar a Vitória de Samotrácia, emocionada, admirada a contemplá-la... Não sei quanto tempo fiquei quieta ali, parada diante de algo que esperei por tanto tempo... Onde quer que se olhe, numerosas obras-primas dos grandes artistas europeus como Ticiano, Rembrandt, Michelangelo, Jacques-Louis David, Vermeer, Bosch, Jan van Eyck, Rubens, Van der Weyden, Frans Post, Van Dyck, Brueghel, Lucas van Leyden, Giotto, Fra Angelico, El Greco, Goya, Velásquez e tantos mais... Numa das maiores mostras do mundo da arte e cultura humanas... Hora de continuar o passeio, destino: Monalisa: mas ali está...! Ela, e eu, trêmula diante daquele pequeno (em diâmetro, uma tábua de álamo, um pouco entortada e milhões de rachaduras de tinta e verniz já ressecados) quadro, uma corda a separá-lo dos visitantes, segurança até os dentes, e eu ali, arrebatada, em oração, contemplativa e o choro já não mais contido...
Mal me refazia duma emoção, era tomada por outras, diante da Vénus de Milo, não foi diferente, o silêncio era de fato entrecortado pelo choro que fluía leve, livre, entontecido... Não era fácil conter-me e não contive-me, minha preocupação primeira foi sentir, e senti!
Saí pelo museu feito uma criança que ganha antecipadamente seu presente de natal esperado a vida inteira. Por onde olhava, andava, havia o que se ver: enormes coleções de artefatos do Egito Antigo, da Civilização Greco-romana, Etrusca, Artes Decorativas e Aplicadas, Gravuras e Desenhos, Esculturas, Arte Islâmica, Antigüidades do Oriente Próximo, e...!
Rumamos para a Torre Eiffel, não sem antes me calar quando vislumbrei um pedaço do Arco do Triunfo, o olhar deslumbrado sobre o Museu de Rodin, o Pantheon... Muita coisa para um olho tão pequeno e uma alma ilimitada... Na Torre, mais emoção com uma pausa para um lanche, nos jardins que ladeam a avenida que leva à ela. Outro forte momento... Ali estava, exuberante, iluminada, cores azuis por toda ela, esplendorosa!
Dia seguinte, apesar de muito cansada, mas com uma energia vinda dos céus, porque adorava caminhar pela urbe, e assim apreendê-la.
Destinos: Sacré Coeur e Notre Dame de Paris. A brancura do Sagrado Coração é uma visão inefável, uma das mais belas vistas, Paris sob meus pés, descobrir sem pressa o Montmartre e observar o conjunto arquitetônico descansava meus olhos da imponência da própria cidade... Andar pelos boulevards, avenidas, ruas e pontes, enchia-me duma liberdade jamais imaginada. Era muito mais prazeroso andar a pé do que tomar um metrô, ônibus ou taxi. Queria viver o ar que ela emanava, queria entrar naquela atmosfera, e o fiz. A chegada à Notre Dame, com uma pausa na Praça da Bastilha (claro que outra vez a História está ali... Refiz todo o processo da Queda da Bastilha), espasmos de emoção me perseguiram durante todo o tempo em que estive na cidade. O Rio Sena serpenteando-a toda, a beleza das pontes não era comprometida pelo gris do cimento armado. Seguia como quem jamais houvera visto qualquer tipo de beleza, porque não há, a minha concepção de belo agora se dá antes e depois de Paris.
... Parada diante da exuberante Catedral Gótica mais importante do mundo, sentia-me tão pequena e tão grande ao mesmo tempo. Fiquei fantasiando o Quasímodo e a Esmeralda se embrenhando pelos recantos, portas, labirintos da Catedral... Acorda, querida! Adentre a igreja e vá se deliciar com a arquitetura e a beleza desse monumento.
À noite, hora de caminhar pela av Champs Elyseés, que iluminada para o natal, ganha ainda mais um aspecto irrefutável de magia... Enquanto flanava pela avenida, o riso iluminava a cara, olhava tudo como se acabasse de sair de uma cegueira inexplicável. Ao final da avenida, na Place Etóile, a confluência de várias ruas e o Arco do Triunfo no centro: deslumbrante! Saí como louca circulando e fotografando todas as faces do Arco.
A cidade encanta pela beleza, e está em todos os recantos, bares, cafés, na sua arquitetura, exuberante, imponente, por todos o lados, suas perspectivas urbanas e suas avenidas, enche as nossas vistas de uma beleza descomunal, sem falar nos seus vários museus e monumentos. Um encantamento que nunca acaba... E oferece a todos, toda forma de poesia.
Por um momento senti-me em meio às manifestações do maio de 68 (“alguns filósofos e historiadores afirmaram que essa rebelião foi o acontecimento revolucionário mais importante do século XX, por que não se deveu a uma camada restrita da população, como trabalhadores ou minorias, mas a uma insurreição popular que superou barreiras étnicas, culturais, de idade e de classe”).
Mas Paris também têm o outro lado da moeda, conflitos sociais de toda ordem, causados pelas divergências raciais, étnicas. Os imigrantes cada vez mais qualificados, já não interessam à cidade, filhos e netos desses imigrantes que têm dupla cidadania, não encontram espaço na cidade, são sobrantes, diante da configuração do mercado de trabalho. Por outro lado também, não desejam voltar ao país de origem dos seus familiares porque também já não são de outro lugar, que não aquele que não os querem lá. Qualquer um é um concorrente para os poucos postos de trabalho.
Tanto na Torre, quanto nos metrôs, ruas e outros monumentos, os policiais estavam lá armados até à quinta geração, sempre em número igual ou superior a três, atentos e olhando o derredor como se qualquer um fosse um inimigo em potencial. Muita tensão, no ar e nas ruas, era tangível. Vidros estilhaçados nos metrôs, gente deitada nas ruas, trânsito caótico, muitos condutores de veículos mal educados, desrespeitando a faixa de pedestre, uma batalha desigual entre pessoas e automóveis. O que desmistifica certos estereótipos com relação às cidades européias. Tao “normal” como qualquer grande centro.
Mas à parte dos problemas e tensões, Paris é um lugar que se deve ir, voltarei mais vezes e com mais calma, quero viver outros momentos lá e visitar outros lugares que não pude visitar em funçao do exíguo tempo. Paris está incrustrada em minha alma!
As luzes brilhavam, e eu extasiada admirava o que via. Entre emocionada e deslumbrada, um frio percorrendo a espinha, lágrimas silenciosas desciam pela face... Um filme pela memória, uma volta no tempo, há quanto, eu esperava por esse momento? Enfim chegou... Ali não havia sorriso mais feliz que o meu.
A saída do aeroporto Charles de Gaulle foi permeada por pensamentos, enquanto o trem percorria o caminho e me levava rumo ao coração de Paris (e o meu em festa), e ao hostal, uma certa tensão no ar. Quando saí do metrô, “tipos esquisitos” beiravam os arredores da estação, mas a experiência alertava-me para o cuidado, e fiquei atenta, enquanto não me senti segura, não relaxei. Em Paris estava muito frio, e isso me faz tomar mais cuidado, afinal os passos são mais rápidos, o olhar mais cabisbaixo e a coluna fica mais vergada...
...Eu estava em Paris. Repetia silenciosamente: estou em Paris! A cidade do meu imaginário, o lugar dos meus sonhos de pré-adolescência. Sem jamais ter ido lá antes, via com clareza algumas paisagens e monumentos. Paris, tão cantada e decantada por poetas e cantores. Quantas vezes foi ficcionalizada, filmada e serviu de palco de revoltas furiosas, revoluções, passeatas, reivindicações e amores avassaladores...? Fez e é História; desde quando Paris, a cidade das luzes, me habitava? E me alimentava esse sonho de um dia estar nela, tanto quanto ela estava em mim?
Mas a hora era inapropriada para algo além dos pensamentos, o Montmartre me pareceu familiar, e o tempo permitiu-nos apenas deixar a bagagem e procurar algum lugar onde pudéssemos comer algo e tomar um café...
Paris vestira-se de dourado para nos receber, as folhas das árvores eram de um amarelo ouro, a confundirem-se com a íris dos meus olhos, que de cor-de-cajá, passara a outonal.
Ah, como lamento a minha limitação, como eu queria dizer belezas sobre a mais bela cidade do mundo? Não sou capaz, mas o que aqui deixo são as emoções que essa cidade me causou na alma...
A chegada ao Palais du Louvre não foi tão logo, afinal, queria passar no Centro Pompidou, mas à medida que eu me aproximava da Quadra do Louvre, criava alma nova e asas nos pés, o coração era só felicidade: Musée du Louvre! Entre o rio Sena e a Rue de Rivoli, o seu pátio central, ocupado agora pela pirâmide de vidro, diante dela, não me contive e outra vez (sou chorona que é uma beleza), as lágrimas me acudiam para não me engasgar com o nó na garganta... Saí disparada olhando tudo, captando tudo, cada detalhe do prédio do museu... E, e meus olhos adquiriam brilho novo, a boca rasgada de contentamento. Já havia planejado o que queria ver, afinal, em menos de uma semana não dá pra ver nem a metade do Louvre. Óquei, ingressos comprados, mapa na mão, hora de realizar mais um sonho... Tá ali, ali! O caminho para a Monalisa, entre ela e eu, a escadaria Darú, eu não andava, mas voava para avistar a Vitória de Samotrácia, emocionada, admirada a contemplá-la... Não sei quanto tempo fiquei quieta ali, parada diante de algo que esperei por tanto tempo... Onde quer que se olhe, numerosas obras-primas dos grandes artistas europeus como Ticiano, Rembrandt, Michelangelo, Jacques-Louis David, Vermeer, Bosch, Jan van Eyck, Rubens, Van der Weyden, Frans Post, Van Dyck, Brueghel, Lucas van Leyden, Giotto, Fra Angelico, El Greco, Goya, Velásquez e tantos mais... Numa das maiores mostras do mundo da arte e cultura humanas... Hora de continuar o passeio, destino: Monalisa: mas ali está...! Ela, e eu, trêmula diante daquele pequeno (em diâmetro, uma tábua de álamo, um pouco entortada e milhões de rachaduras de tinta e verniz já ressecados) quadro, uma corda a separá-lo dos visitantes, segurança até os dentes, e eu ali, arrebatada, em oração, contemplativa e o choro já não mais contido...
Mal me refazia duma emoção, era tomada por outras, diante da Vénus de Milo, não foi diferente, o silêncio era de fato entrecortado pelo choro que fluía leve, livre, entontecido... Não era fácil conter-me e não contive-me, minha preocupação primeira foi sentir, e senti!
Saí pelo museu feito uma criança que ganha antecipadamente seu presente de natal esperado a vida inteira. Por onde olhava, andava, havia o que se ver: enormes coleções de artefatos do Egito Antigo, da Civilização Greco-romana, Etrusca, Artes Decorativas e Aplicadas, Gravuras e Desenhos, Esculturas, Arte Islâmica, Antigüidades do Oriente Próximo, e...!
Rumamos para a Torre Eiffel, não sem antes me calar quando vislumbrei um pedaço do Arco do Triunfo, o olhar deslumbrado sobre o Museu de Rodin, o Pantheon... Muita coisa para um olho tão pequeno e uma alma ilimitada... Na Torre, mais emoção com uma pausa para um lanche, nos jardins que ladeam a avenida que leva à ela. Outro forte momento... Ali estava, exuberante, iluminada, cores azuis por toda ela, esplendorosa!
Dia seguinte, apesar de muito cansada, mas com uma energia vinda dos céus, porque adorava caminhar pela urbe, e assim apreendê-la.
Destinos: Sacré Coeur e Notre Dame de Paris. A brancura do Sagrado Coração é uma visão inefável, uma das mais belas vistas, Paris sob meus pés, descobrir sem pressa o Montmartre e observar o conjunto arquitetônico descansava meus olhos da imponência da própria cidade... Andar pelos boulevards, avenidas, ruas e pontes, enchia-me duma liberdade jamais imaginada. Era muito mais prazeroso andar a pé do que tomar um metrô, ônibus ou taxi. Queria viver o ar que ela emanava, queria entrar naquela atmosfera, e o fiz. A chegada à Notre Dame, com uma pausa na Praça da Bastilha (claro que outra vez a História está ali... Refiz todo o processo da Queda da Bastilha), espasmos de emoção me perseguiram durante todo o tempo em que estive na cidade. O Rio Sena serpenteando-a toda, a beleza das pontes não era comprometida pelo gris do cimento armado. Seguia como quem jamais houvera visto qualquer tipo de beleza, porque não há, a minha concepção de belo agora se dá antes e depois de Paris.
... Parada diante da exuberante Catedral Gótica mais importante do mundo, sentia-me tão pequena e tão grande ao mesmo tempo. Fiquei fantasiando o Quasímodo e a Esmeralda se embrenhando pelos recantos, portas, labirintos da Catedral... Acorda, querida! Adentre a igreja e vá se deliciar com a arquitetura e a beleza desse monumento.
À noite, hora de caminhar pela av Champs Elyseés, que iluminada para o natal, ganha ainda mais um aspecto irrefutável de magia... Enquanto flanava pela avenida, o riso iluminava a cara, olhava tudo como se acabasse de sair de uma cegueira inexplicável. Ao final da avenida, na Place Etóile, a confluência de várias ruas e o Arco do Triunfo no centro: deslumbrante! Saí como louca circulando e fotografando todas as faces do Arco.
A cidade encanta pela beleza, e está em todos os recantos, bares, cafés, na sua arquitetura, exuberante, imponente, por todos o lados, suas perspectivas urbanas e suas avenidas, enche as nossas vistas de uma beleza descomunal, sem falar nos seus vários museus e monumentos. Um encantamento que nunca acaba... E oferece a todos, toda forma de poesia.
Por um momento senti-me em meio às manifestações do maio de 68 (“alguns filósofos e historiadores afirmaram que essa rebelião foi o acontecimento revolucionário mais importante do século XX, por que não se deveu a uma camada restrita da população, como trabalhadores ou minorias, mas a uma insurreição popular que superou barreiras étnicas, culturais, de idade e de classe”).
Mas Paris também têm o outro lado da moeda, conflitos sociais de toda ordem, causados pelas divergências raciais, étnicas. Os imigrantes cada vez mais qualificados, já não interessam à cidade, filhos e netos desses imigrantes que têm dupla cidadania, não encontram espaço na cidade, são sobrantes, diante da configuração do mercado de trabalho. Por outro lado também, não desejam voltar ao país de origem dos seus familiares porque também já não são de outro lugar, que não aquele que não os querem lá. Qualquer um é um concorrente para os poucos postos de trabalho.
Tanto na Torre, quanto nos metrôs, ruas e outros monumentos, os policiais estavam lá armados até à quinta geração, sempre em número igual ou superior a três, atentos e olhando o derredor como se qualquer um fosse um inimigo em potencial. Muita tensão, no ar e nas ruas, era tangível. Vidros estilhaçados nos metrôs, gente deitada nas ruas, trânsito caótico, muitos condutores de veículos mal educados, desrespeitando a faixa de pedestre, uma batalha desigual entre pessoas e automóveis. O que desmistifica certos estereótipos com relação às cidades européias. Tao “normal” como qualquer grande centro.
Mas à parte dos problemas e tensões, Paris é um lugar que se deve ir, voltarei mais vezes e com mais calma, quero viver outros momentos lá e visitar outros lugares que não pude visitar em funçao do exíguo tempo. Paris está incrustrada em minha alma!
Valda Colares escreve no Blog Canto da Boca
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