Entrevista
Um homem que gosta de outros homens
A entrevista deste mês tem um alto poder de octanagem. O entrevistado é conhecido na blogosfera como Autor. A sua base de operações é o blog Confissões a Esmo, o lugar onde, diz ele, destila sandices, pensamentos e idéias. “Conto a minha vida, as minhas dúvidas e inquietações. São confissões jogadas ali, a torto e a direito. Para agrado ou desagrado de quem quer que seja”, revela com sinceridade.
Autor tem 27 anos, é formado em Administração de Empresas, mora em Petrópolis, no Rio de Janeiro e trabalha no setor público. Entre idas e vindas, faz cinco anos que está na blogosfera. Durante muito tempo manteve um blog onde usava o nome verdadeiro e falava do cotidiano, além de colocar contos e crônicas. Depois de uma parada estratégica para recarregar as baterias, voltou com o blog no formato atual, criando a figura do Autor. “Ali sou realmente eu. O Autor nasceu como personagem, mas hoje é o mais próximo da realidade possível”, confessa. A opção pelo codinome aconteceu por conta da homossexualidade. Ele explica: “Não sou assumido para toda a sociedade e não faço questão disso. Para quem interessa saber, me identifico. Muitos leitores passaram a conhecer a pessoa por trás do Autor. Tenho muitos leitores no MSN e fiquei amigo de alguns”.
Por ter como temática o dia a dia de um homem gay, achou que seria lido apenas por gays. Não foi o que aconteceu. Há muitos heteros entre os internautas que acessam o Confissões a Esmo (pelo menos 150 IPs diferentes todo o dia) e comentam com naturalidade tudo que ali é abordado.
Conheça, a seguir, um pouco da história e da personalidade do Autor, um personagem que revela sem pudor a dor e a delícia de ser o que é.
Como foi a descoberta da sua orientação sexual?
Nasci numa cidade do interior do RJ e, para mim, gays eram aqueles travestis marginalizados por todos. Não queria ser como eles. Entretanto, desde adolescente percebi que tinha atração por garotos. Mas como isso não impedia que eu tivesse também atração por garotas, não me achava tão diferente. Era igual aos meus amigos, com gostos semelhantes, apenas com a diferença de achar um ou outro cara mais bonito ou gostoso. Com o passar do tempo e com as primeiras relações sexuais (com ambos os sexos) passei a me encarar bissexual. Conseguia separar bem na minha cabeça: com mulher havia a idealização romântica, com homem era apenas sexo. Até o dia em que me apaixonei por um cara e toda essa simplificação feita caiu por terra.
Você assumiu a sua homossexualidade publicamente?
Me encarar verdadeiramente gay só depois que fiz amigos que eram gays e vi que eram pessoas normais, como eu, e não um estereótipo como eu imaginava. Entretanto, ainda hoje, não me considero uma pessoa totalmente assumida com respeito à minha orientação sexual. Não é um assunto do qual eu fale abertamente no meu dia a dia Não sou assumido para a sociedade em geral. Mas, o mais importante, assumi para mim mesmo que sou homossexual e esse foi o passo mais importante para que me tornasse quem sou hoje.
"Relacionamento é um contrato e cada um sabe as cláusulas que vai colocar ali. Pra mim, fidelidade é uma dessas cláusulas. Já trai, mas não sei lidar com traição".
Que situação você considera ter sido fundamental para que encarasse a natureza sua sexualidade?
Acredito que foi conhecer aquele que é hoje o meu melhor amigo. Com ele vi que ser gay não necessariamente significava estar enquadrado num estereótipo específico. Foi a partir desta amizade que passei a me aceitar. E isso aconteceu de forma natural, afinal, eu tinha um amigo que era como eu e me apresentava outras pessoas que eram como nós. Quando vi, já tinha alguns amigos gays e me sentia à vontade com eles. Não me assustei, vi que eu não era uma aberração e sim uma pessoa normal. Um homem que gostava de outros homens.
Houve alguma mudança na sua relação com amigos e parentes e na relação deles com você?
Essa é uma barreira que consegui quebrar há pouco tempo: contar para meus melhores amigos (incluindo aí dois amigos homens) que era gay e tinha um namorado.
Tinha medo que ao contar isso a amizade mudasse e eles se afastassem. Fui surpreendido positivamente. Não só aceitaram muito bem como fizeram questão de se aproximar e de mostrar, a todo momento, que nossa amizade é o que realmente importa.
E com a família, como foi?
Com meus pais é mais complicado. São extremamente religiosos e não encarariam numa boa ter um filho gay. Ou saber que o filho mais velho é gay. Mas moro em outra cidade, sozinho, tenho a minha vida, eles não se envolvem muito. Quando os visito, ouço as perguntas de sempre (‘quando vai casar?’, ‘não vai nos dar um neto?’), mas levo a minha vida, sem ter a necessidade de contar nada para eles.
Você já se defrontou com algum tipo de preconceito?
Não. Acredito que por ser muito bem humorado, não dou brecha para preconceito. Além disto, como as pessoas não têm certeza, já que nunca assumi nada publicamente, talvez o preconceito não chegue claramente até mim. Claro que existem piadinhas e brincadeiras, como existem num grupo de heteros, por exemplo. E nessas horas eu sempre rio e brinco junto.
"É fato: gay tem preconceito contra gay"
Você tem desejo por mulher?
Sexo com mulher sempre foi bom para mim. Entretanto, prefiro o sexo com homens.
Já fui noivo e pensei seriamente em casar. Claro que isso era também uma forma de fugir desse meu desejo por homens e por minha ex ser uma pessoa com quem eu tinha certeza que teria uma vida ótima, já que mais do que noiva era minha amiga. E foi exatamente por isso que terminamos. Estava me sentindo hipócrita, enganando alguém que eu amava e mentindo para mim mesmo. Nunca contei para ela que gosto de homens. A última vez que transei com uma mulher deve ter uns 2, 3 anos.
Depois que terminei com meu ex namorado acabei engatando o namoro com o meu atual e por isso não transei mais com mulheres. Acho que não teria problema algum em me envolver com uma mulher novamente, apesar de não querer viver um relacionamento com uma, algo que eu saberia que não supriria todo o meu desejo.
Como você lida com a infidelidade?
Já traí e acho que já devo ter sido traído (apesar de nunca ter ficado sabendo disso).
Acho que relacionamento é um contrato e cada um sabe as cláusulas que vai colocar ali. Pra mim, fidelidade é uma dessas cláusulas. Não sei lidar com traição.
Como disse, já traí. Não me orgulho disso. Nesses casos, acredito que a infidelidade foi apenas mais um sintoma de que o relacionamento já tinha acabado. Nunca ficaram sabendo que eu estava traindo. Eu fiz bem feito (que horror!).
Você tem preconceitos? Como lida com eles?
Tenho muitos. Digo mais, o preconceito no meio gay é enorme. Gay tem preconceito contra gay. Fato! Tanto é que existem várias tribos dentro do universo gay: travestis, barbies, ursos, afeminados.
Eu luto contra os meus próprios preconceitos. Um exemplo: não gostava de gente afeminada. Tinha vergonha de ser visto junto, de ficar próximo. Hoje, luto contra isso. Aprendi que essas pessoas, normalmente, não são dessa forma porque querem. Elas simplesmente são assim. Lembro sempre do que uma amiga me falou que ouviu de sua terapeuta, algo mais ou menos assim: “O preconceito é natural no ser humano. O que temos de fazer é a cada dia deixar pra trás alguns preconceitos, pois adquirimos novos e assim sucessivamente.”
A entrevista deste mês tem um alto poder de octanagem. O entrevistado é conhecido na blogosfera como Autor. A sua base de operações é o blog Confissões a Esmo, o lugar onde, diz ele, destila sandices, pensamentos e idéias. “Conto a minha vida, as minhas dúvidas e inquietações. São confissões jogadas ali, a torto e a direito. Para agrado ou desagrado de quem quer que seja”, revela com sinceridade.
Autor tem 27 anos, é formado em Administração de Empresas, mora em Petrópolis, no Rio de Janeiro e trabalha no setor público. Entre idas e vindas, faz cinco anos que está na blogosfera. Durante muito tempo manteve um blog onde usava o nome verdadeiro e falava do cotidiano, além de colocar contos e crônicas. Depois de uma parada estratégica para recarregar as baterias, voltou com o blog no formato atual, criando a figura do Autor. “Ali sou realmente eu. O Autor nasceu como personagem, mas hoje é o mais próximo da realidade possível”, confessa. A opção pelo codinome aconteceu por conta da homossexualidade. Ele explica: “Não sou assumido para toda a sociedade e não faço questão disso. Para quem interessa saber, me identifico. Muitos leitores passaram a conhecer a pessoa por trás do Autor. Tenho muitos leitores no MSN e fiquei amigo de alguns”.
Por ter como temática o dia a dia de um homem gay, achou que seria lido apenas por gays. Não foi o que aconteceu. Há muitos heteros entre os internautas que acessam o Confissões a Esmo (pelo menos 150 IPs diferentes todo o dia) e comentam com naturalidade tudo que ali é abordado.
Conheça, a seguir, um pouco da história e da personalidade do Autor, um personagem que revela sem pudor a dor e a delícia de ser o que é.
Como foi a descoberta da sua orientação sexual?
Nasci numa cidade do interior do RJ e, para mim, gays eram aqueles travestis marginalizados por todos. Não queria ser como eles. Entretanto, desde adolescente percebi que tinha atração por garotos. Mas como isso não impedia que eu tivesse também atração por garotas, não me achava tão diferente. Era igual aos meus amigos, com gostos semelhantes, apenas com a diferença de achar um ou outro cara mais bonito ou gostoso. Com o passar do tempo e com as primeiras relações sexuais (com ambos os sexos) passei a me encarar bissexual. Conseguia separar bem na minha cabeça: com mulher havia a idealização romântica, com homem era apenas sexo. Até o dia em que me apaixonei por um cara e toda essa simplificação feita caiu por terra.
Você assumiu a sua homossexualidade publicamente?
Me encarar verdadeiramente gay só depois que fiz amigos que eram gays e vi que eram pessoas normais, como eu, e não um estereótipo como eu imaginava. Entretanto, ainda hoje, não me considero uma pessoa totalmente assumida com respeito à minha orientação sexual. Não é um assunto do qual eu fale abertamente no meu dia a dia Não sou assumido para a sociedade em geral. Mas, o mais importante, assumi para mim mesmo que sou homossexual e esse foi o passo mais importante para que me tornasse quem sou hoje.
"Relacionamento é um contrato e cada um sabe as cláusulas que vai colocar ali. Pra mim, fidelidade é uma dessas cláusulas. Já trai, mas não sei lidar com traição".
Que situação você considera ter sido fundamental para que encarasse a natureza sua sexualidade?
Acredito que foi conhecer aquele que é hoje o meu melhor amigo. Com ele vi que ser gay não necessariamente significava estar enquadrado num estereótipo específico. Foi a partir desta amizade que passei a me aceitar. E isso aconteceu de forma natural, afinal, eu tinha um amigo que era como eu e me apresentava outras pessoas que eram como nós. Quando vi, já tinha alguns amigos gays e me sentia à vontade com eles. Não me assustei, vi que eu não era uma aberração e sim uma pessoa normal. Um homem que gostava de outros homens.
Houve alguma mudança na sua relação com amigos e parentes e na relação deles com você?
Essa é uma barreira que consegui quebrar há pouco tempo: contar para meus melhores amigos (incluindo aí dois amigos homens) que era gay e tinha um namorado.
Tinha medo que ao contar isso a amizade mudasse e eles se afastassem. Fui surpreendido positivamente. Não só aceitaram muito bem como fizeram questão de se aproximar e de mostrar, a todo momento, que nossa amizade é o que realmente importa.
E com a família, como foi?
Com meus pais é mais complicado. São extremamente religiosos e não encarariam numa boa ter um filho gay. Ou saber que o filho mais velho é gay. Mas moro em outra cidade, sozinho, tenho a minha vida, eles não se envolvem muito. Quando os visito, ouço as perguntas de sempre (‘quando vai casar?’, ‘não vai nos dar um neto?’), mas levo a minha vida, sem ter a necessidade de contar nada para eles.
Você já se defrontou com algum tipo de preconceito?
Não. Acredito que por ser muito bem humorado, não dou brecha para preconceito. Além disto, como as pessoas não têm certeza, já que nunca assumi nada publicamente, talvez o preconceito não chegue claramente até mim. Claro que existem piadinhas e brincadeiras, como existem num grupo de heteros, por exemplo. E nessas horas eu sempre rio e brinco junto.
"É fato: gay tem preconceito contra gay"
Você tem desejo por mulher?
Sexo com mulher sempre foi bom para mim. Entretanto, prefiro o sexo com homens.
Já fui noivo e pensei seriamente em casar. Claro que isso era também uma forma de fugir desse meu desejo por homens e por minha ex ser uma pessoa com quem eu tinha certeza que teria uma vida ótima, já que mais do que noiva era minha amiga. E foi exatamente por isso que terminamos. Estava me sentindo hipócrita, enganando alguém que eu amava e mentindo para mim mesmo. Nunca contei para ela que gosto de homens. A última vez que transei com uma mulher deve ter uns 2, 3 anos.
Depois que terminei com meu ex namorado acabei engatando o namoro com o meu atual e por isso não transei mais com mulheres. Acho que não teria problema algum em me envolver com uma mulher novamente, apesar de não querer viver um relacionamento com uma, algo que eu saberia que não supriria todo o meu desejo.
Como você lida com a infidelidade?
Já traí e acho que já devo ter sido traído (apesar de nunca ter ficado sabendo disso).
Acho que relacionamento é um contrato e cada um sabe as cláusulas que vai colocar ali. Pra mim, fidelidade é uma dessas cláusulas. Não sei lidar com traição.
Como disse, já traí. Não me orgulho disso. Nesses casos, acredito que a infidelidade foi apenas mais um sintoma de que o relacionamento já tinha acabado. Nunca ficaram sabendo que eu estava traindo. Eu fiz bem feito (que horror!).
Você tem preconceitos? Como lida com eles?
Tenho muitos. Digo mais, o preconceito no meio gay é enorme. Gay tem preconceito contra gay. Fato! Tanto é que existem várias tribos dentro do universo gay: travestis, barbies, ursos, afeminados.
Eu luto contra os meus próprios preconceitos. Um exemplo: não gostava de gente afeminada. Tinha vergonha de ser visto junto, de ficar próximo. Hoje, luto contra isso. Aprendi que essas pessoas, normalmente, não são dessa forma porque querem. Elas simplesmente são assim. Lembro sempre do que uma amiga me falou que ouviu de sua terapeuta, algo mais ou menos assim: “O preconceito é natural no ser humano. O que temos de fazer é a cada dia deixar pra trás alguns preconceitos, pois adquirimos novos e assim sucessivamente.”
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