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segunda-feira, 16 de março de 2009

EntreAspas

“A gente se acostuma para poupar a vida”
Marina Colasanti

Cheguei em BH pisando devagar. Por medo de não querer voltar. Os olhos pareciam não dar conta de olhar. Saudade demais para caber dentro deles.
Era dia de trabalho e eu já havia me esquecido como a capital dos metais fervilhava em horário comercial. Minhas últimas visitas foram sempre em fins de semana, quando a vida tinha uma outra ordem. E a metáfora das formiguinhas me ocorreu assim que entrei na Afonso Pena. Um mundo de gente indo, outro mundo voltando. Cada qual voltado para seus próprios pensamentos. Mas formavam um conjunto interessantíssimo de ser observado.
Não vim para observar – pensei comigo. Mas como não me perder na variedade que uma grande cidade me apresentava? E fui dividindo a atenção entre pessoas e pontos da cidade que me traziam sorrisos à lembrança. A escadaria da Igreja São José, uma das mais antigas, me lembrou das muitas vezes em que matávamos aula tomando sorvete e olhando quem entrava e saía do cine Acaiaca.
O imponente cinema não existe mais. Também não existem mais estudantes nas escadarias da São José. Existem mendigos, crianças pedindo comida, crianças correndo entre os carros, cola, baseado, tíner. Existe vida - bonita e nem tão bonita, querida e nem tão querida.
E de esquina em esquina, fui revivendo as minhas experiências – antigas e nem tão antigas. O mais interessante é que saí de BH há apenas alguns anos, mas era como se fosse há um século. O meu olhar era novo. Eu via o que certamente não veria se ainda morasse lá. Isso me fez pensar no quanto nos integramos à paisagem e à vida das cidades e das pessoas. A ponto de perdermos o melhor ou o pior delas.
Fico me perguntando se não é assim em tantas das nossas relações. Com a cidade onde vivemos, com as pessoas com as quais convivemos, com as situações que vivenciamos e presenciamos. Nossas relações vão se tornando lineares, nossas reações cada vez mais insensíveis, nossas emoções quase imperceptíveis. Perdemos o melhor - e o pior - delas porque o nosso olhar se estreita, nossos gestos se repetem, nossos sentimentos se acomodam.
A gente se acostuma. Mas deveria?


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