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domingo, 30 de novembro de 2008

EntreAspas

"Continue com fome, continue bobo"


Dia destes, me perguntaram por que mudei toda a minha vida num momento em que estava realizada e estabilizada econômica e profissionalmente. Lembro-me de ter respondido: gosto de mudanças. Ou algo parecido. Sem dúvida, resposta genérica. Destas que parecem frases feitas e que andam na ponta da língua. Não por desconsideração ao meu interlocutor, mas talvez porque mudança seja parte integrante da minha vida e resposta para muitos dos meus atos. Depois pensei sobre. E me lembrei do discurso de Steve Jobs.

Jobs, o brilhante executivo criador do sistema operacional Macintosh, maior concorrente do nosso velho conhecido Windows, faz neste discurso a trajetória de sua vida. Com seus altos e baixos, seus fracassos e vitórias. E o termina falando de morte e de vida – especialmente de vida. Deste discurso, tirei o título entre aspas. Deste discurso, veio a vontade de escrever este texto.

Algumas pessoas se espantam com minha espontaneidade, com o que dizem ser irreverência, com minha sempre disposição e disponibilidade para viver o coletivo, com minha constante busca do novo e, especialmente, com a fome com que me jogo na vida. É fato que nossa carga genética é responsável por grande parte do que somos. Mas também é fato que somos muito do que vivemos. E vivi um bocado em poucos anos. E foi neste pouco tempo que muito de mim foi moldado.

Eu mal havia saído da adolescência quando vi a cara feia da morte. Embora eu já estivesse acostumada a flertar com ela nas minhas loucas investidas contra um sistema que amordaçava nossas bocas e nos fazia sonhar com a liberdade, nunca a havia sentido tão perto de mim. Foi um acidente. E como a maioria dos acidentes, idiota. Costumo me lembrar dele com certo humor, mas os minutos que passei pendurada sobre o nada mudaram por completo meu olhar sobre e para a vida.

Desde então, aprendi a viver cada dia como se fosse o último. E sendo o último, cada dia me nasce como uma caixa de segredos que tenho a obrigação de desvendar. E o mais importante: cada dia é um presente. Como uma fruta madura que eu chupo até o caroço, ainda que um pouco do caldo me escorra pelos cantos da boca. Este presente é meu, ninguém vai vivê-lo para mim. Ninguém além de mim poderá sentir o sabor da minha própria vida. Nem dar a ela a cor mais quente ou mais brilhante. E se é dado a mim o direito de escolha, opto por ser boba. Opto por acreditar que o mundo tem jeito, que faço minhas próprias regras, que posso fazer diferença ainda que para poucas pessoas. E opto por ter esta fome de vida que me faz inteira. E sendo, viver a vida como a quero: nova a cada dia, minha a cada hora.

Mas para que esta seja a minha verdade, o meu caminho, a minha oração, é preciso mais que a lembrança daqueles minutos pendurados no abismo. É preciso continuar sendo boba, é preciso continuar com fome.


O discurso de Jobs pode ser lido na íntegra
aqui no blog Errantes navegantes.

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