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segunda-feira, 11 de maio de 2009

EntreAspas

Quase democraticamente, o pessoal do Palimpnóia escolheu Viagens e Homens como dois dos temas deste mês de maio. Eu que adoro os dois, pensei logo em fazer uma puta crônica. Mas estou na fase de, no maximo, contar histórias. E como respeito cada uma das minhas fases, vou tentar fazer um croniconto. Assim, tentarei ser fiel à fase e aos temas.
Foi há muito tempo atrás. Estava eu numa das minhas dramáticas crises conjugais. Não por desgaste do casamento, mas por falta dele - marido que ficava 15 dias em casa e dois meses no norte do país era marido? Aquele era o momento em que não sabia se me dedicava a ser mãe, a ser pai, se trocava lâmpadas, se olhava o óleo do carro, se consertava a torneira, se dava aulas ou se enfiava a cabeça na areia e deixava o mundo explodir.
Para não perder de vez a sanidade, resolvi enlouquecer para o mundo. Não era a primeira e nem seria a última loucura. Era apenas mais uma atitude porralouca, como tantas que já tive e que, vez em quando, ainda tenho. Eu me coloquei aberta a todas as possibilidades. E que Deus me ajudasse.
Em poucas horas estava eu na rodoviária brigando por uma passagem de um ônibus que estava de saída. Cambaleando entre as poltronas, literalmente caí sobre um rapaz no fundo do ônibus. Sem olhar para ele, me desculpei, ajeitei-me e fechei os olhos. Queria dormir embalada pelo som do motor e esquecida de quem eu era e do que havia aprendido – inclusive da minha carteira de motorista. Fui tirada do meu propósito pela mochila que despencou sobre as pernas do meu companheiro. Pernas compridas, coxas grossas. Um homem grande que se espremia no lado da poltrona que eu tanto queria.
- Você não acha que suas pernas são grandes demais pra ficarem espremidas aí?
Trocamos de lugar. E começamos um longo papo. Fiquei sabendo tudo que era importante sobre ele. E à medida que sabia, me encantava. Não sei se pelo que ouvia ou pelo simples movimento de seus lábios. Tinha a boca mais beijável que tinha visto nos últimos tempos.
Contei a ele sobre mim. Comecei pelo casada - como se assumindo a minha condição de comprometida, fosse acalmar as borboletas que já revolucionavam o estômago e os sentidos. Em menos de duas horas eu já havia me esquecido de quase tudo que deixara para trás. O cara era daqueles que não tinham medo de ser feliz. Medo de ser feliz? Por que eu pensava isso? Andava tão acostumada a homens que vestem a carapaça de durões que me encantei ao encontrar um que mostrava a alma. E o mais interessante: ele via a minha.
Foram 4 horas de encantamento. E eu ia registrando coisas como olhos úmidos ao falar da avó, sorriso terno ao se lembrar da ex-noiva, postura endurecida ao me contar sobre o cotidiano deum sub-gerente de banco. Ele era transparente e eu queria ser seu espelho. Minhas invencíveis borboletas estavam alvoroçadas e completamente esquecidas que eu vivia uma crise.
Ao chegarmos ao destino, não queria me levantar. E se ele sequer me desse seu telefone? Não deu. Foi simpático, amigo, ajudou-me a juntar minha bagunça, deu-me um beijo demorado no rosto e se foi. Eu olhava suas costas sem acreditar. Nunca antes alguém me dispensara. Querendo ou não eu tinha que reconhecer: minhas atabalhoadas intenções foram linda e ternamente dispensadas.
Levei alguns dias para me esquecer da dor no ego. E nunca me esqueci do homem. Este homem foi o primeiro a me colocar frente a frente com uma das grandes incoerências femininas: o que se quer de um homem? Um anjo ou um demônio? As duas coisas, descobri. Jamais me esquecerei da delicadeza, sensibilidade e amizade daquelas 4 horas. Mas tenho que reconhecer: eu queria tudo isso aliado ao interesse do homem pela mulher. Talvez, nem tanto os olhares indiscretos que a bunda feminina costuma ganhar, nem os pensamentos libidinosos que estes olhares revelam. Mas, desinteresse assim por completo?
Homens! Se não tê-los, como entendê-los? E que me perdoe Vinicius!


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