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segunda-feira, 3 de novembro de 2008

EntreAspas

“Stop.
A vida parou
Ou foi o automóvel?”


Sou muito audaciosa! Começo colocando entre aspas o meu poeta maior. Mas a idéia é esta: tirar, de quem sabe, um pingo de inspiração.

Sem dúvida este poema de Drummond demonstra uma grande inquietação existencial. Esta que nos toma vez ou outra e que nem sempre nos damos conta. Mas se você, leitor, pensa que vou enveredar por estes caminhos, enganou-se. A minha inquietação é concreta, palpável e quase sexual. Para ser mais correta: paranóica. Completamente em convergência com o nome deste espaço. Estou parada. Imobilizada na vontade de fazer algo que lembre vagamente que tenho um blog, mas que se distancie dele como gato de água fria.

E nesta briga para inovar, pus o barco sem vela em mar aberto. Imagina você que me peguei perguntando se em algum lugar deste planeta poderá existir outra pessoa que tenha nascido na mesma hora, no mesmo dia, mesmo mês, mesmo ano que eu e que seja do sexo masculino. Concluí que sim. Muitas. Mas não parei aí. Fui mais longe. Vesti a pele de uma destas pessoas e resolvi me sentir como ela.

O primeiro passo foi tentar amortecer o meu feminismo para abrir os braços ao machismo. Porque não há dúvidas de que estamos falando de um belo representante do chauvinismo. E pintou a primeira dificuldade. Imaginar uma cabeça pensando entre as minhas pernas foi o grande desafio. E olha que eu ainda não havia chegado ao estágio da tal cabeça parar de pensar e começar a pulsar. Não vou conseguir. As minhas pulsações são internas e vão direto ao coração.

Sou teimosa. Não desisti. E para provar a mim mesma que conseguiria, resolvi colocar em prática a experiência. Endireitei os ombros e até ensaiei uma voz mais grave. O foda é a falta de testosterona. E aquela coisa balançante entre as pernas. Como será que um homem consegue andar com o saco balançando ou enforcado dentro das calças? Fui em frente. E passei a imaginar o meu jeito de andar. Não rolou. Andar neste momento é uma das minhas impossibilidades. Olhei o gesso, o gesso me olhou e quase desisti de ser homem.

Mudei a direção das minhas preocupações e passei a pensar no assédio masculino. Homem que é homem tem que saber deixar uma mulher molhada só com o poder do olhar. Nem sempre. Lembrei daqueles peões da construção onde passo todos os dias. Eles não olham. Eles comem com os olhos. E ao invés de molhar, eles nos secam. Não. O homem que estou vestindo tem certa sofisticação. Machão, mas machão sofisticado. Parei. Estou sendo preconceituosa. Para me sentir como homem teria que ir mais fundo. Talvez vestir a pele de um peão mesmo. Ou de um metalúrgico. Mais bonito que o Lula, please!

E nesta pré-construção de personagem, perdi o rumo do dia. Acordei com o grito do telefone e os trocentos papeizinhos sobre a mesa me olhando feio. Ah o dever. Guardei, num cantinho da única cabeça que tenho, os pedaços do eu-macho.

E sem saber se foi a vida ou foi o automóvel que parou, deixo descansar em paz o Poeta (meu conterrâneo, que orgulho!) e paro por aqui. Quem sabe o que me aguardará na próxima esquina? Ou no próximo texto?

Macho man - Village People

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