Páginas

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Jens: Pequenos canalhas




A estupidez da humanidade nunca deixa de me surpreender. Minha mais nova fonte de estarrecimento é o tal de bullying, a denominação chique para a velha e antiga provocação praticada por adolescentes nas escolas, atualmente resolvida na bala.
No meu tempo não era assim. A pegação de pé, como hoje, era através de apelidos depreciativos. No Ginásio Padre Réus alguns apodos entraram para a história da instituição, como, por exemplo, Cadela, Gão e Solange. O primeiro se chamava Júlio, mas tinha uma cara e um olhar carente de cadela abandonada. O segundo pertencia à turma mais velha – estava no Científico – e era um bom jogador de basquete (os caras do Científico não jogavam futebol de salão, esporte preferido pela plebe infantil – nós, os ginasianos). O problema com o Gão era quando um gaiato, prudentemente oculto, berrava “Vem cá, Gão”. O cara ficava uma fera. Identificado o engraçadinho, a briga era certa. Seu nome de batismo perdeu-se nos escaninhos da História. Já Solange era o codinome do Artur, meu colega de turma. Ele tinha cabelo crespo e ruivo (depois foi apelidado de Bombril), que lembrava a galinha de estimação do Carlos Bronco Dinossauro- a Solange, naturalmente –, personagem interpretado por Ronald Golias, no programa A Família Trapo, um sucesso de audiência da TV Record nos anos 60.
Ontem, como hoje, as alcunhas não eram aceitas pacificamente. Naquela época, a honra era restabelecida com socos e pontapés, na pracinha em frente ao colégio, depois da aula (“pedrada não vale”). O interessante é que não havia revanche. O perdedor aceitava o resultado e a vida seguia em frente – não sem antes os contendores levarem uma tunda dos genitores. Naquele tempo, os pais acreditavam ser sua obrigação impor regras de comportamento aos filhos, e uma delas é que não deviam brigar no colégio, não importa o motivo. A gente sabia: brigou na rua, apanhou em casa. Simples assim – “endurecer sem jamais perder a ternura”, a receita de civilização preconizada pelo doutor Benjamin Spock bem antes de Che Guevara.
Pessoalmente, não tive maiores problemas nesta área. Nos anos de delinquência fui chamado de Mister, Kopachevisky (o Kopa) e Bolo Fofo.Os dois primeiros foram em razão do meu segundo nome (Edi) acoplados a séries de tevê. Mister, fazia referência a Mister Ed um cavalo falante. Kopachevisky por causa do soldado Ed Kopachevisky, personagem de um eposódio da série Combate . Bolo Fofo foi quando eu era lindinho e gorduchinho (graças às doses industriais de Biotônico Fontoura e Toddy, ministradas pela mãe). Só quem me chamava assim era a sorridente e carinhosa Naira. E a Nairinha, meu primeiro amor, podia tudo. Assim, sem estresse.
Outros camaradas não foram tão felizes, como o Coveiro (alemão, magro, alto e cadavérico – um excelente goleiro de futsal – o fdp defendeu um dos meus melhores chutes), o Dezudo (um nerd que só tirava 10, tentamos fazer sexo com ele durante todo o Ginásio; aparentemente, ninguém conseguiu), o Touro Louco (protagonista da maior briga que já presenciei – um dia (re)conto como foi), e o Pãozinho (no tempo em que os guris bonitos eram chamados de Pão – vão no Google, jovens).
Pra não dizer que não falei das mulheres, registro a Maria Olho de Boi (Maria Catarina, na verdade. Coxodulzíssima, também) e a Maria do Lordo (uma magrela provocante que ostentava um traseiro encantador. A propósito, “lordo” é uma palavra que não se encontra nos dicionários, mas, suponho, vocês sabem do que se trata).
Eram assim, aqueles tempos: bobagens, bobagens e bobagens. Éramos também, cruéis, certamente. Mas, no final, todo mundo se salvava. Armas, jamais.

8 comentários:

Miguel S. G. Chammas disse...

Camarada, por faltade apelido eu nãomorreria, tive vários, uns pegaram outros não, e se não pegaram é por que eu, simplesmente, não esbravejava com os meus ofensores. Então, a provocação ia por terra.
Os que ficaram foram: Mi e Miguelzinho (caseiros), Turco, Nasquifa e Nasca (por causa de meu nariz um tanto quanto saliente), Miguelito e Bailarino....
Até eu, nofinal, me chamava assim rsrsrsrs

15/6/10 08:35
Shirley disse...

Jens, eu nunca sofri esse tipo de atrocidade )pelo contrário, eu sempre fui a queridinha em todos os colégios e outrso gruptichos que frequentei) - pelo menos não dos alunos. uma professora, a maria da fé (só se fosse fé no demo!) me bullyngou toda a minha 2.a série, num gosto nem de lembrar. sabe que acho que isso de bylling é coisa de americano mesmo: aqui no brasil as coisas nem se comparam com as coisas de lá (pelo menos é o que agente vê nos filmes e seriados, né?), mas morro de medo de que um dia nos equiparemos - brasileiro e essa mania de copiar os ianques, vôte! uma pena que as coisas não aconteçam mais assim, tão "inocentemente" quanto nos nossos tempos... :-(
querido, um beijo e parabéns por essa delícia de texto! :-)

15/6/10 10:48
Игорь disse...

Oi Jens . A vida neste aspecto era mais fácil , as contendas eram resolvidas entre a molecada e não me recordo da assustadora figura do "juiz de menores ".

Hoje o bullyng é matéria de Crimnologia .

abs

15/6/10 18:57
Zeca disse...

Eita textinho bão, sô!
Me trouxe saudade dos meus tempos de ginasiano, quando fui chamado de Zorba (por ser o primeiro a usar aquelas cuecas), também precursor do Cacá, pelo carinho das gatinhas e de alguns outros, a maioria de origem carinhosa. Saudade das brigas que combinávamos na esquina, fora dos limites do ginásio, claro. E, como você disse, o perdedor aceitava e a pendenga ficava resolvida. Hoje, pelo que vejo na mídia, as coisas estão bem mais violentas, mais uma importação bananeira dos vícios e maus costumes dos norte-americanos!
Cada vez mais sinto saudades das décadas de sessenta e setenta!
Boa pedida, como sempre! Parabéns!

15/6/10 20:45
Jota Effe j disse...

No meu tempo (acho que sou jurássico), nem essas brincadeiras "inocentes" eram vistas. Eu nunca tive apelidos, e os poucos que vi aplicados a colegas não tinham origem nas salas de aulas, mas nas brincadeiras praticadas aos domingos. Hoje é uma tristeza o que se vê. Meu abraço.

19/6/10 18:06
Cecília disse...

Nem me fale, Meu Amigo...
No meu tempo (e olha que não faz tanto tempo assim, tenho 27) colocávamos apelidos e algumas briguinhas pra “lavar a honra”, eu me meti em duas, e mainha, graças a Deus e ao meu choro de manha nunca ficou sabendo, se bem que foi coisa boba, mas hoje, é canivete, caco de vidro, cadeira, revólver...
No começo deste mês aconteceu uma aqui em Recife que me deixou chocada: um grupo de 5 meninas atacaram uma outra garota na sala de aula no intervalo de uma aula para outra e desfiguraram menina com canivete e unhadas uma amiga tentou ajudar e levou uma pancada com uma cadeira, tudo isso porque a menina que apanhou não sedia às provocações de umas dessas meninas que a espancaram.
Noto que a violências nas escolas está cada vez maior e não atinge só os adolescentes e crianças, os professores e funcionários também são vitimados, o pior é que não é apenas em escolas do Estado e da Prefeitura, acontece também em escolas particulares...
Os pais e diretores estão cada vez mais impotentes (ou condescendentes) diante de tudo isso...
Muito Triste!!!

Beijinhos

20/6/10 18:44
Magui disse...

O que falta é senso de humor. Inclusive havia ajuste de contas na porta do colégio.Só não eram gravadas e postas no Youtube.

2/8/10 10:44
Celso Ramos disse...

Olá Jens!!!
Será que ainda consigo entrar na tua toca? Estou voltando a escrever lentamente, ou pelo menos do jeito que tempo permitir!!!Abraços!!!

13/1/15 18:13
 
PALIMPNÓIA | by TNB ©2010